quinta-feira, dezembro 08, 2011

“A Espera”










Procuraste, procuraste
Nada encontraste por detrás dos armários
Quem escondeu foi o mesmo que te corrompeu
Que te roubou o olhar enigmático de seda
De cada vez que olhavas para além daquela chaminé encarvoada
Em busca do Pai Natal que não chegava
O galo cantou, a aurora chegou e tu ali permanecias
Dormitavas à lareira onde o café se fazia numa cafeteira
Perdeste o encanto envolto no manto róseo de franjas delicadas
Soltaste um grito de gato assanhado que está acorrentado:
- Eu aqui declaro que nunca, nunca mais me visto de azul claro
Para esperar por um velho de barbas brancas vestido de encarnado.
 
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quinta-feira, novembro 17, 2011

"A Marcha do Nu"

Nus ao mundo nós viémos
Nus embora havemos de ir
Nus todos os dias ficamos
Nus sem conseguir rir.
Nus, simplesmente nus.

Nus de fome sangrenta
Nus sem abrigo nem casa
Nus com conhecimentos
Nus muito esperançados
Nus sem apelo nem graça
Nus, simplesmente nus.

Nus carecas, penteados
Nus sujos, lavados, sebentos
Nus gordurosos, vinagrentos
Nus inodoros, perfumados
Nus magros, obesos, cansados
Nus, simplesmente nus.

Nus revoltados, vingativos
Nus agressivos, transviados
Nus loucos, parados, dormentes
Nus, simplesmente nus.

Nus sem sonhos, sem casas, sem livros
Nus sem camisas, sem sapatos, sem dentes
Nus sem famílias, sem amigos, sem parentes
Nus, simplesmente nus.

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segunda-feira, março 07, 2011

“Os Meus Sapatos”


O que vem, o que vai, o que fica

Desta amiga bonita que trago dentro de mim

Sapatos engravatados,

Que pisam soalhos molhados

Que riem, troçam de mim

Escondem-se agasalhados

Com medo de tantos ratos

Que por ali andam, sempre à espreita

Aguardam a cada esquina

Um resvalar, daquela doce menina

Que me acompanha na vida

Eles matreiros atacam

Retiram atilhos, desapertam os sapatos

Correm soltos e aflitos

E pelo meio de choros e gritos

Vencem todas as batalhas

Regressam ao seu sossego

E dizem-lhe: Não tenhas medo.

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quarta-feira, fevereiro 16, 2011

“Progresso”


Por fora canela

Por dentro jasmim

Matei a cadela

Flori o jardim

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“A Insana Mente”


A insana mente

Desliza, escorrega

A insana mente

Repudia, escarnece

A insana mente

Ataca, desfalece

A insana mente

Cansada, adormece

A insana mente

Mente!

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“Solta-se a Besta”


Rebenta

Rebenta com os cascos

A cavalgadura podre que dorme

Abre

Abre a vaga das marés

Que não tardam a chegar

Rasga

Rasga as emoções

Escritas de sangue

São horas categóricas

Profundas, lamentáveis

Inscritas de poderes

De críticas contorcidas

Virulentas, manchadas

Solta

Solta as amarras, os grilhões

Que tanto pesam, que torturam

Lava

Lava tudo ao pormenor

E que nada fique, que nada reste

Das sombras, dos monstros

Que te habitam

Limpa

Limpa a calçada, as estepes

Os ventos finos e agrestes

E sobe

Sobe, vem ao patamar

Das folhas caídas

Das flores a voar

Com cheiros de rosas

Com cheiros de mar.

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